Leny Andrade, 'primeira-dama do jazz brasileiro', morre aos 80 anos
Anúncio
Apoiado por
Com seu contralto comovente e com toque de cigarro e estilo emotivo de “bossa-jazz”, ela hipnotizou o público e a crítica.
Por Alex Williams
Leny Andrade, a cantora brasileira que conquistou seguidores internacionais com sua fusão comovente de samba, bossa nova e jazz americano e a quem Tony Bennett certa vez chamou de Ella Fitzgerald do Brasil, morreu em 24 de julho no Rio de Janeiro. Ela tinha 80 anos.
Sua morte, em um hospital, por pneumonia, foi confirmada em comunicado de uma casa de repouso para artistas do Rio onde ela morava. Ela também havia sido tratada de demência com corpos de Lewy.
Muitas vezes chamada de “a primeira-dama do jazz brasileiro”, Andrade (pronuncia-se ahn-DRAH-jay) saiu dos clubes do Rio, onde se apresentou quando adolescente, para construir uma carreira de seis décadas, gravando mais de 35 álbuns como pioneira do que ela passou a chamar de bossa-jazz.
Em 2007, Andrade ganhou um Grammy Latino por “Ao Vivo”, álbum ao vivo com o célebre pianista brasileiro César Camargo Mariano.
“Leny é um dos maiores improvisadores do mundo”, disse certa vez Bennett, que morreu no mês passado. “Eu amo o jeito que ela canta. Ela é original.
Cantando principalmente em português, Andrade trouxe riqueza e profundidade emocional às faixas geladas da bossa nova, aos sambas de acelerar o pulso e às baladas comoventes, que ela infundiu com uma sensualidade cansativa do mundo.
Numa crítica à sua estreia americana em 1983 no clube de jazz Blue Note em Nova Iorque, John S. Wilson do The New York Times elogiou o poder emotivo que ela trouxe para “Cantador”, uma balada na intensa tradição de Edith Piaf. “A senhorita Andrade canta com uma voz mais sombria e suave que a de Piaf”, escreveu ele, “com um efeito dramático que chega até a um ouvinte que não entende português”.
A carreira de Andrade decolou nos Estados Unidos em 1993, depois que ela se mudou para Nova York, onde se tornou uma atração popular, apresentando-se no Birdland e em outros clubes, às vezes com Bennett e Liza Minnelli na plateia. No ano seguinte, ela tocou no Lincoln Center e também no Hollywood Bowl em Los Angeles.
Sua voz, um contralto profundo e amadeirado com um ar de quem já viu tudo, trazia um toque áspero de seu longo caso de amor com os cigarros. O efeito geral pode ser fascinante.
“Descrever a Sra. Andrade como Sarah Vaughan e Ella Fitzgerald da bossa nova só vai até certo ponto ao evocar uma artista cuja voz parece conter o corpo e a alma do Brasil”, escreveu Stephen Holden ao revisar uma apresentação em um clube de Nova York em 2008 em Os tempos.
“Você pode pensar que conhece 'The Girl From Ipanema'”, continuou ele, mas “você não a absorveu realmente até ouvir a Sra. Andrade cantá-la em português; disgorge pode ser uma palavra melhor do que cantar, já que, como tudo o mais que ela executa, parece brotar do centro da terra.”
Para Dona Andrade, cantar trouxe sustento. “Minha alma é tudo que posso oferecer ao público”, disse ela em entrevista em 2013 ao site de música brasileiro Esquina Musical. “Quando abro a boca, qualquer dor passa. Eu canto sem medo. Meus amigos e inimigos me abraçam.”
“Quando canto”, acrescentou ela, “embarco em um tapete mágico saindo daqui. Eu viajo para Marte.”
Leny de Andrade Lima nasceu no Rio em 26 de janeiro de 1943. Seu pai, Luiz de Oliveira Lima, e sua mãe, Ruth Couto de Andrade, se divorciaram quando Leny era jovem. Ela cresceu no Méier, bairro da Zona Norte da cidade, reduto do samba.
Por insistência de sua mãe, Sra. Andrade estudou piano clássico e canto a partir dos 6 anos. Ganhou uma bolsa de estudos no Conservatório Brasileiro de Música. Beethoven e Brahms, porém, não eram o seu destino.
Ela ficou encantada com a bossa nova (“new wave” em português), que fundia os ritmos tradicionais brasileiros com o jazz americano, que emergiu das praias do Brasil no final dos anos 1950. Ela também foi influenciada pelo estilo de samba da popular cantora brasileira Dolores Durán.
“Mostrei meu diploma de piano para minha mãe”, disse ela em entrevista à televisão brasileira em 2013, e disse-lhe: “'Esqueça a ópera, a música clássica. Vou cantar música popular – por causa de Dolores Durán.'”